Bar e Restaurante Familiar Tabu

Cossacos de Kuban 0003

Prontuário Individual 5635 . Fundo SSP-DOPS/PE – APEJE

Salada e sopa russa (borsch), repolho recheado, caviar da Ukraina, vodca russa. O cardápio do Bar e Restaurante Familiar Tabu, tão diferente aos olhos pernambucanos, é um dos documentos do prontuário funcional criado a respeito do estabelecimento pela DOPS/PE. Mas não apenas as comidas eram distintivas: a programação da casa também. Consta, no “Diario de Pernambuco” de 27 de janeiro de 1944, que o local realizou um cocktail em homenagem ao cantor Nelson Gonçalves. A festa foi promovida pelos gins Ashleys, representada pelo pintor e decorador português Mattos Siqueira, companheiro da fotógrafa Janina Maryla Bloch.

O Tabu funcionava na Rua do Hospício, 65, no bairro da Boa Vista. Não se sabe exatamente a data de fundação do estabelecimento, mas, segundo informação encontrada em um pequeno relatório datilografado em papel timbrado da Secretaria de Segurança Pública (SSP) de Pernambuco a respeito dos dois proprietários do Tabu, Leônidas Ordingew (ou Ordyngew) e Boris Popoff, a abertura ocorreria naquela mesma semana. Os dois informaram, em depoimento prestado à polícia marítima, que haviam se associado cerca de dois meses antes da inauguração com a finalidade de abrir o negócio. A ideia era inaugurar um estabelecimento com 22 mesas e com um serviço constante de músicas e canções regionais, com uma orquestra […] contratada, tocando apenas à noite.

Entre os documentos do prontuário, chamam atenção os relatórios de campanas realizadas no Tabu ao longo de um mês, de 20 de janeiro a 20 de fevereiro de 1945. Provavelmente, o espaço era vigiado tanto pelo fato de receber figuras estrangeiras, militares ou suspeitas (segundo as notas do investigador encarregado do local) quanto pelo passado e origem dos seus proprietários. Assim, o comportamento de Leônidas e Boris, a frequência do bar e o teor das conversas travadas nas mesas do estabelecimento eram observadíssimos. Conclusão dos investigadores: o Tabu deverá merecer permanente vigilância da D.O.P.S. Poderá bem prestar-se para ponto de reunião de elementos suspeitos ou já escrachados, patrícios dos seus proprietários.

Leônidas, casado com a brasileira Maria Ordingew, foi prontuariado em 1944 pela DOPS/PE sob suspeita de ser simpatizante do nazismo. Aqui, ele declarou à polícia que havia estudado Teologia no Instituto Ortodoxo de Saint Sergio, deixando depois de alguns anos Marselha, na França, com destino a Santos, onde chegou em 1931. Seguiu então para São Paulo, atuando na paróquia Ortodoxa Russa de São Nicolau, na Cruz Vermelha Russa e em firmas construtoras. A partir de 1938, passou a trabalhar com a companhia de espetáculos Cossacos de Kuban, viajando para dezenas de cidades do Brasil. Deixou o grupo artístico em 1941 e passou a trabalhar na Companhia de Tecidos Paulista (de propriedade dos Lundgren). Leônidas, no entanto, dizia-se contrário ao nazismo, e que a desconfiança sobre sua simpatia nasceu na verdade de desentendimento ocorrido no Carnaval: estava na rua da Imperatriz com sua esposa e seu cachorro quando um transeunte, ao tomá-lo por alemão, afirmou que seu animal chamava-se Hitler. Ao responder com uma pilhéria (disse que o cachorro chamava-se Getúlio), desentendeu-se com o interlocutor, que chamou um guarda.

Já Boris, segundo o prontuário do Tabu, era elemento que parece estar a exigir imediata atenção. Saíra da Europa via Hamburgo e vivia no Brasil desde 1929, afirmando-se russo branco. Teria lutado por cinco anos na Primeira Guerra Mundial. Morou em Santos (sem profissão declarada), depois mudou-se para o Rio, trabalhando como eletricista, até 1941. Em seguida foi contratado como inspetor pelo laboratório americano Forster Mac Clellan Co., fabricante das então amplamente divulgadas Pílulas Forster. Chegou ao Recife em 1941, casou-se com Alexandra Andrievski e passou a atuar no ramo de drogarias e farmácias da cidade. Segundo a DOPS/PE, Boris era inteligente, ardiloso, falastraz, respostas sempre prontas e hábeis.

A última referência encontrada nesta pesquisa a respeito do Tabu é da década de 1960. Seu nome é citado em notícia publicada pelo “Diario de Pernambuco” de 26 de outubro de 1961 em função de uma ocorrência registrada em frente ao estabelecimento, situado, agora, na Rua Nova.

 

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